Dia 383 - Jorge (São)...
Olhos opacos, abatidos, marejados, avistando um horizonte inexistente...
Voz embargada, mãos calejadas ao peito, boca seca de palavras e um coração que saltava do peito...
Se o conheço? Conheço não... Mas ele existe, teve três filhas, todas casadas, graças a Deus foi o que ele disse levando as mãos aos céus com dedo em riste e em respeito. A Aquele que sabe muito mais que todos nós.
Foi na porta da casa D’Aquele que sabe mais do que todos nós que nossos caminhos se cruzaram, foi até a casa D’Ele buscar perdão, por um (mal) feito.
Por isso a voz embargada, os olhos marejados e a boca seca de palavras.
Um pai que para defender a filha feriu seu agressor. Mesmo ciente de que ele (o agressor) estava tomado pelas drogas e usa constantemente de violência, ao que muitos diriam nem perdão merecia, ele se sentia mal. Reconhecendo ter uma forma frágil e sofrida, não pela idade mas pelos anos de luta, que nem tanto podia fazer, mas, fez o que pode na sua dor, sentia-se cansado, mas, disse que se precisasse faria tudo de novo, mesmo achando que até o que ele fez foi errado. Por isso estava ali...
Mora no mesmo morro, que tem nome de santo, desde os 13 anos - disse ele. Ele também tem nome de santo, um que mata dragão.
Ele queria entender a razão da sua falta de razão. Com seu jeito humilde me contava: - Eu vim pra acalmar meu coração, e um soluço engolia. Meu Deus! Quanta tristeza tinha naquele olhar!
Na garganta, preso ao soluço que não exprimiu no rolar de sua lágrima, sem dizer sequer uma palavra, me dizia que ali Deus ajudava, ali se sentia bem, com Deus se encontrava e seu coração também.
Eu pensava que reclamamos demais as vezes, sabemos muito pouco ou quase nada. Todo mundo sofre, só que há realidades onde os instintos não são controlados, onde violência é comum, não há coitado porque está todo mundo no mesmo barco ou sujeito a uma situação precária e cruel. Falta comida, falta palavra, falta tudo, tudo... ser humano é ser um animal em aprimoramento moral.
Podemos achar que enxergamos essa realidade, mas, só vemos a nossa perspectiva. A realidade é de quem a vive e sente.
Como alguém que filma pra postar e não ajuda, vendo o outro se afogar na sua dificuldade. O que vale mais? Filmar o faminto ou lhe dar um pão?
Pessoas em construção somos nós, para falar brandamente, algumas ainda encontramos o coração e outras, me falta compreensão para falar... E sabe, o mais difícil de tudo é perdoar...
Porque é fácil falar de perdão quando é no outro a dor ou o castigo... mas, é na prática que realmente se aprende o ofício...
Ele sofria porque se mortificava, não se perdoava, o auto flagelo da culpa e da impotência...
E quantas vezes, assim como ele, nós também?
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