Dia 87 - Deus Decepção

Gosto de deixar registrado no Blog alguns poemas, músicas e trechos de autores que admiro, alguns conhecidos, outros nem tanto...mas o fato é que há muito quero colocar um poema aqui.
Minha mãe sempre adorou poemas e quando criança folheando um de seus livros me deparei com o que irei transcrever abaixo, foi minha primeira lição sobre discriminação e segregação, este poema significa muito para mim e um dia espero que um filho meu o leia, ele me diz mais do que posso explicar, nunca o esqueci e espero que gostem...Beijos! Geo

_________________:)__________________


Eu, cheio de preconceitos, racista!
Eu, com falsos conceitos, neo-nazista!
Eu, detestando pretos.
Eu, sem coração...
Eu, perdido num coreto, gritando: "-Separação!"
Eu, você, nós...nós todos, cheios de preconceitos. Fugindo como se eles carregassem lodo, lodo na cor...e com petulância, arrogância, afastando a pele irmã.
...Mas, estou pensando agora: E quando chegar a minha hora???
Meu Deus, se eu morresse amanhã, de manhã???
Numa viagem esquisita, entre nuvens feias e bonitas, se eu chegasse lá?
E um porteiro manco, como os aleijados que eu gozei viesse abrir a porta, e eu reparasse sua vista torta, igual aquela que eu critiquei?
Se sua mão tateasse pelo trinco, como as mãos do cego que não ajudei?
Se a porta rangesse, chorando os choros que provoquei?
Se uma criança me tomasse pela mão, criança como aquela que não embalei...?
E me levasse por um corredor florido, colorido, como as flores que eu jamais dei?
Se eu sentisse o chão frio, como dos presídios que não visitei?
Se eu visse as paredes caindo, como das creches e asilos que não ajudei?...e se a criança tirasse corpos do caminho, corpos que eu não levantei dando desculpas que eram bêbedos, mas era epiléticos, que era vagabundagem, mas era fome.
Meu Deus! Agora me assusta pronunciar seu nome!
E se mais prá frente a criança cobrisse um corpo nu, da prostituta que eu usei, ou do moribundo que não olhei, ou da velha que não respeitei, ou da mãe que não amei...? Corpo de alguém exposto, jogado por minha causa, porque não estendi a mão, porque no amor fiz pausa e dei, sei lá, dei só desgosto.
E, no fim do corredor, o início da decepção!
Que raiva, que desespero se visse o mecânico, o operário, aquele vizinho, o maldito funcionário e até, até o padeiro, todos sorrindo não sei de quê...Ah! sei sim, rirem da minha decepção.
Deus não está vestido de ouro, mas como???
Está num simples trono.
Simples como não fui, humilde como não sou.
Deus decepção!
Deus na cor que eu não queria, Deus cara-a-cara, face-a-face sem aquela imponente classe.
Deus simples! Deus negro!
Deus negro e eu...racista, egoísta.
E agora???
Na terra só persegui os pretos. Não aluguei casa, não apertei a mão.
Meu Deus você é negro, que desilusão.
Será que vai me dar uma morada? Será que vai apertar minha mão?
Que nada! Meu Deus, você é negro, que decepção!
Não dei emprego, virei o rosto.
E agora?
Será que vai me dar um canto, vai me cobrir com seu manto?
Ou vai virar o rosto no embalo da bofetada que dei???
Deus, eu não podia adivinhar porque você se fez assim?
Por que se fez preto, preto como o engraxate, aquele que espulsei da frente de casa.
Deus, pregaram você na cruz e você me pregou uma peça, eu me esforcei a bessa em tantas coisas, e cheguei até a pensar em amor, mas nunca, nunca pensei em adivinhar sua cor!
(Poema extraído do livro "DEUS NEGRO", de Neimar de Barros)


SOMOS TODOS IGUAIS!!

Comentários

Anônimo disse…
Olá Geovanna...todos devemos admitir que temos nossos preconceitos... eu por exemplo sou faccioso...sempre defendo minha facção... partilho esta história consigo.
SABEM A HISTÓRIA DO BALÃO PRETO? O velho dos balões há anos que ia aquela feira vender os seus balões. Assim, naquele dia, bem cedo, lá foi com o seu carrinho levar a alegria às crianças que ainda exultam nas pequenas coisas. Era um regalo ver aquele ramo de cores pronto a subir ao céu, não fosse estar preso por um fio que o velho atara ao carro. Bem cedo também chegara um menino, pobre no vestir, preto, de carapinha suja, parecendo um pau com dois olhos grandes. Sentara-se a alguma distância do carro dos balões, e por ali ficou apreciando aquele ritual das bolas de cor saindo de casa e afastando-se para longe, acima da multidão, pelas mãos da criançada. Assim se passou a manhã até que ao velho só restou um balão. Um balão que ninguém levou. Um balão preto. O menino aproximou-se do velho e perguntou:
- Porque ninguém levou este balão?
O velho olhou o balão preto e de seguida o menino negro e bem depressa percebeu o seu dilema. Desfez o nó que segurava o balão ao carrinho e deixou-o subir livre em direcção ao céu. Ficaram ambos de cabeça erguida até que desaparecesse. Depois olhou o menino e disse:
- Sabes, não é a cor do balão que o faz subir…mas sim o que está lá dentro….
Um Beijo
Vicente
Elvira Carvalho disse…
Também como diz o Vicente, sei que no fundo sempre temos um pouco de preconceito e racismo. Por muito que apregoemos o contrário. Porque ser racista e preconceituoso não é só o branco, que maltrata o negro, o cigano etc.
Quando eu passo na rua e viro a cara para não ver o sem abrigo a dormir nos cartões, não estou a ser, aquilo que sempre apregoo que não sou?
Um abraço


´Já lá está a explicação sobre Viana. Estava a escrevê-la, quando lá foi.
António Inglês disse…
Geo

Só somos diferentes por fora, por dentro somos todos feitos da mesma matéria...
Que interessa a cor, a raça, o credo?
Nascemos todos da mesma maneira e da mesma maneira vamos acabar.
Racismo? Pois nós até apregoamos que não, que não somos...
Como diz a nossa amiga Elvira será que não?
Uma boa noite e um abraço
José Gonçalves
Anderson San disse…
O mundo fica mais bonito colorido, brancos , pretos ou pardos. Quem faz o preconceito são as pessoas, que visam dinheiro, estatus e suas benfeitorias, cor de pele não diz o carater pessoal e nem tão menos suas atitudes cotidianas.
Branco ( neguinho )
Anônimo disse…
Como avisado , seu blog agora adicionado , na lista dos favoritos ,agora, o mais procurado ... visitante assiduo como prometi , nao posso perder tanto conteudo em ti ... peço desculpas pelos versos acima... foi empolgação momentanea que as vezes emana dentre minhas ideias insanas ... opa desculpe de novo
Agora serio : muito oportuna a poesia de hoje. Fucionou como um espelho quebrado que mostra nossas imagens distorcidas pelos nossos prejulgamentos constantes , e preconceitos gritantes que assombram nossas almas... um beijo carinhoso para uma musa inspiradora . continuo anonimo , mas nao mais por muito tempo. Nao acha que a curiosidade é um bom inicio para uma ótima amizade ?